IDEAS PARA ADIAR O FIM DO MUNDO - AILTON KRENAK


Oi, amigos. O post de hoje é um pouco mais denso e mais sério, porém super importante. Espero que você fique comigo até o final. Recentemente li "Ideias para adiar o fim do mundo" do Ailton Krenak, foi uma leitura incrível, porém dolorosa. Ao meu ver, tudo que causa dor também carrega um ensinamento profundo.

Esse livro é extremamente essencial, especialmente porque nos faz vibrar e refletir sobre alguns assuntos que consideramos desnecessários. "Não é preciso se preocupar com nosso planeta, ele vai bem". Alguns insistem na negação (estamos vendo isso mais do que nunca diante da pandemia do COVID-19). "Tudo vai bem", "Ora, mas isso é uma grande bobagem", "Ué, você está acreditando nisso tudo? HAHA, é só pra vender mais". Normalmente são aqueles que gostam e se aproveitam desse sistema cruel, aqueles que não vêem mal nenhum na destruição da natureza, pois afirmam que é essencial termos mais recursos, mais fábricas, mais produtos. "Temos que melhorar a economia", eles dizem.

Esse pequeno livro irá nos convidar, de uma maneira intensa e poética, a refletir sobre como estamos lidando com nosso planeta, como estamos lidando com a nossa própria existência. Ele comenta que estamos convocados a nos tornarmos uma humanidade zumbi, seres que só pensam em si mesmos, que caminham cegos e cambaleantes para o abismo, achando que jamais cairão. E uma característica principal e horripilante é que essa humanidade zumbi - que estamos vendo crescer a cada dia de forma assustadora - não quer compreender o outro, só olha para o outro com olhares julgadores de punição e ódio. Ailton ainda diz que esse tipo de gente não tolera prazer, fruição de vida. Nesses tempos, mais do que do nunca, vemos o quanto isso é verdade.

Ailton Krenak é ativista, nasceu na região do Vale do Rio Doce, território do povo Krenak. Infelizmente a ecologia do local está terrivelmente afetada pela extração de minérios. Ailton vem lutando e participando de projetos que defendem o meio ambiente e os direitos dos povos indígenas. Este livro, na verdade, é o texto de uma palestra que o autor deu no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. E eu não tenho como recomendá-lo o suficiente: é necessário, é urgente, por favor, leia! Quanto mais pessoas refletindo sobre o tema, melhor.

Tem uma passagem que muito despertou minha atenção (aliás, foram várias) e quero compartilhar com vocês para que possamos começar essa reflexão:

"Quando nós falamos que nosso rio é sagrado, as pessoas dizem 'Isso é algum folclore deles'; quando dizemos que a montanha está mostrando que vai chover e que esse dia vai ser um dia próspero, um dia bom, eles dizem: 'Não, uma montanha não fala nada'. Quando despersonalizamos o rio, a montanha, quando tiramos deles os seus sentidos, considerando que isso é atributo exclusivo dos humanos, nós liberamos esses lugares para que se tornem resíduos da atividade industrial e extrativista."


Essa passagem me chamou atenção por dois motivos: 

1) por conta do nosso preconceito para com os povos indígenas. Temos que parar de desvalorizar e diminuir a vida e o conhecimento de um povo tão incrível. Não é porque são diferentes de nós, que vivemos nessa sociedade cinzenta e empedrada, que valem menos. Todas as pessoas são importantes, todas as culturas são importantes. 

2) me chamou atenção também por mostrar o quanto realmente não vemos a natureza como parte essencial da nossa existência, não desvalorizamos somente os povos indígenas, desvalorizamos tudo. Tudo - inclusive as tantas coisas que compramos e consumimos, sendo que pouco tempo depois já nem ligamos pra isso também. Nossa existência é superficial e ainda temos coragem de apontar o dedo para os povos indígenas e xingá-los, humilhá-los e diminuí-los.

Os povos indígenas vem sofrendo e não é de hoje. Todos sabemos como se deu a história. Mas como o autor muito bem nos aponta: esses povos vem insistindo e lutando para que o governo cumpra seu dever constitucional de assegurar os direitos desses grupos nos seus locais de origem. Porém, cada vez mais vemos que o governo não se importa e os locais indígenas acabam sendo ocupados pela máquina de consumo da nossa sociedade atual.

O autor comenta sobre seu local de origem, olha só:

"O Wattu, esse rio que sustentou a nossa vida às margens do rio Doce, entre Minas Gerais e o Espírito Santo, numa extensão de seiscentos quilômetros, está todo coberto por um material tóxico que desceu de uma barragem de contenção de resíduos, o que nos deixou órfãos e acompanhamos o rio em coma."



Isso é de uma tristeza que se aprofunda na alma. E se você, querido leitor, não se entristece com isso, significa que você já está fazendo parte daquela humanidade zumbi desprovida de sentido de vida, de sentimento, de prazer. Talvez seja a hora de despertar. A verdade é todos estamos caminhando para o abismo, mas isso não é de agora. Mesmo um conhecimento mínimo em história nos possibilita perceber que a coisa já vem nessa direção há algum tempo.

"Isso é um abismo, isso é uma queda. Então a pergunta a fazer seria: por que tanto medo assim de uma queda se a gente não fez nada nas outras eras senão cair?"

No entanto, alguns resistem e lutam, outros fazem o que podem para melhorar um pouco situação e contribuir, mesmo com pequenas atitudes. Porém, ainda são muitos aqueles que não se importam, não se preocupam, existem aqueles que nem acreditam que estamos com uma demanda muito alta e que nosso planeta não suportará continuar nesse ritmo. Esses são os que fazem parte da humanidade zumbi, esses que precisam acordar, sair desse sonho em que tudo está bem. Nem tudo está bem. 

Deixarei outra passagem desse livro incrível para que você possa refletir e se questionar.

"Há duzentos, trezentos anos ansiaram por esse mundo. Um monte de gente decepcionada, pensando: mas é esse mundo que deixaram para a gente? Qual é o mundo que vocês estão agora empacotando para deixar às gerações futuras?"



Já tem um tempo que quero fazer essa sessão de recomendações aqui no blog, algo parecido com o que eu fazia na newsletter <3 Espero que vocês gostem!

Para ler



Sinopse: Tratando dos mais diversos temas ― dos mitos de origem às histórias de amor impossível ―, as narrativas conduzem o leitor por situações e desenlaces muito próprios, sempre acompanhadas por um glossário e um texto informativo sobre o povo indígena de origem de cada autor. Esta é uma chance preciosa para todos aqueles que desejam entrar em contato com as raízes mais profundas de nossa cultura, ainda pouco valorizadas e respeitadas, por puro desconhecimento.



Para ouvir: 


Álbum "Ruynas' da banda Andoyde Sem Par. Esse álbum tem faixas com temáticas que abordam temas como ancestralidade e identidade indígena, migração nordestina, relações homoafetivas, equidade e diretos da comunidade LGBTQ+. Recomendo demaaaaais, por favor, ouçam!


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